domingo, 10 de fevereiro de 2019

Livros | Eu Confesso - Jaume Cabré


Este livro caiu-me nas mãos sem que estivesse à espera dele. Quem o fez chegar até mim disse que eu iria adorar. Não se enganou. É daqueles livros que não aparecem na nossa vida por acaso. É daqueles livros que nos fazem viajar no tempo e no espaço, para épocas remotas mas não tão distantes assim da nossa actual realidade. Tornou-se num dos meus livros preferidos e aquele que recomendo sempre.

Eu Confesso relata a história do pequeno Adrià, que cresce numa Barcelona ainda sob o domínio de Franco. Adrià é uma criança especial, no seio de uma família sem amor. Entre os objectivos megalómanos de um pai autoritário e frio e de uma mãe sonhadora e não-amada, Adrià cresce num mundo entre a fantasia e a dura realidade, tímido, solitário, tendo por companhia um violino que esconde uma história em si. Depois da morte violenta e inesperada do pai, Adrià começa a questionar-se sobre o passado do pai e as suas investigações levam-no a recuar no tempo e a descobrir as respostas para as suas inquietações.

Até aqui, parece mais um livro banal. Mas não é, de todo. É um livro que nos faz recuar no tempo, até à Idade Média, passando pela Inquisição, pelo Holocausto e pela ditadura franquista, fazendo-nos perceber que a história tem vindo a repetir-se ao longo dos séculos e que a maldade tem uma e a mesma origem.

É também um livro que fala de amor: de amor à música, de amor aos amigos, de amor à família [seja ela como for], de amor à vida. E toca num ponto que me emocionou bastante: a perda de memória no final da vida. Por mais rica que a mesma tenha sido, corremos o risco de, lá à frente, tudo se apagar e a nossa mente voltar a ser um caderno em branco. Já adulto, Adrià começa a escrever a sua história precisamente porque sabe que a memória lhe começa a falhar e quer deixar registado tudo aquilo de que ainda se lembra.

Apesar de ser um livro belíssimo, não é de leitura fácil. A constante passagem do presente para o passado, por vezes no mesmo parágrafo, faz com que, no inicio, tenhamos alguma dificuldade em apanhar o fio à meada. Mas depois de entrarmos no livro, tudo flui de forma natural.

Em suma, posso dizer que Eu Confesso é um livro que conjuga amor e história, que nos faz reflectir sobre o como chegámos até aqui e sobre os mesmos erros cometidos pela humanidade. É também a prova de que, muitas vezes, a arte tem o poder de nos salvar [seja na forma de música, escrita ou pintura] e é das poucas coisas que permanece em nós quando a memória se evapora.

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