sábado, 4 de maio de 2019

LIVROS | A Desumanização - Valter Hugo Mãe


Talvez a tristeza fosse um modo de envelhecer.

Talvez esta frase possa resumir parcialmente este livro, mais um livro que me tocou e que me deixou meio ensimesmada quando terminei.

A Desumanização é um livro sobre morte. Sobre a morte de Sigridur, irmã gémea de Halldora, a sua outra metade. Sobre aquilo que a morte é capaz de fazer aos que ficam, aos "menos mortos". Porque quando alguém que amamos, que nos é metade, morre, nós também morremos. Uma parte de nós morre, perde-se para sempre. Tal como aconteceu a Halldora, que foi morrendo, um bocadinho todos os dias, depois de perder a irmã. E tal como aconteceu à mãe, que se tornou fria e má para expiar a dor de perder uma filha. E ao pai, que se refugiou nos poemas para amenizar essa perda.

De facto, a morte tem esse poder. E desconfio que seja um acto isolado. Não se morre, vai-se morrendo, continuamente, na vida e nos dias dos que por cá continuam.

É um livro profundamente delicado e ao mesmo tempo visceral, cru. Como um dedo que nos toca na ferida que ainda não sarou. Que nos faz recordar as nossas perdas, quem nos morreu e o que nos morreu. Mas é também um livro de uma profunda beleza, uma carta de amor à Islândia e à sua peculiaridade. Remete-nos ainda para o poder redentor dos livros e da poesia, o que o torna sublime.

"A poesia é a linguagem segundo a qual deus escreveu o mundo. Nós não somos mais do que a carne do poema". E assim termino esta partilha, agradecendo a Valter Hugo Mãe por mais esta maravilha literária.

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